domingo, 26 de novembro de 2017

ÁLVARES DE AZEVEDO - O POETA MORIBUNDO / POST DE JORGE LUIZ DE OLIVEIRA

- INTRODUÇÃO DE JORGE LUIZ DE OLIVEIRA.

- Segue Álvares de Azevedo com seu ilustre poema: "O Poeta Moribundo" ...
Extraído da Segunda Parte de: "Lira dos Vinte Anos", tal poema é um dos meus prediletos, repleto de uma sátira evidente. Abaixo, está o poema.

"O POETA MORIBUNDO

Poetas! amanhã ao meu cadáver
Minha tripa cortai mais sonorosa!...
Façam dela uma corda e cantem nela
Os amores da vida esperançosa!

Cantem esse verão que me alentava...
O aroma dos currais, os bezerrinhos,
As aves que na sombra suspiravam,
E os sapos que cantavam no caminho!

Coração, por que tremes? Se esta lira
Nas minhas mãos sem forças desafina,
Enquanto ao cemitério não te levem,
Casa no marimbau a alma divina!

Eu morro qual nas mãos da cozinheira
O marreco piando na agonia...
Como o cisne de outrora... que gemendo
Entre os hinos de amor se enternecia.

Coração, por que não tremes? Vejo a morte,
Ali vem lazarenta e desdentada...
Que noiva!... E devo então dormir com ela?...
Se ela ao menos dormisse mascarada!

Que ruínas! que amor petrificado!
Tão antidiluviano e gigantesco!
Ora, façam ideias que ternuras
Terá essa lagarta posta ao fresco!

Antes mil vezes que dormir com ela,
Que dessa fúria o gozo, o amor eterno...
Se ali não há também amor de velha,
Dêem-me as caldeiras do terceiro inferno!

No inferno estão suavíssimas belezas,
Cleopatras, Helenas, Eleonoras;
Lá se namora em boa companhia,
Não pode haver inferno com Senhoras!

Se é verdade que os homens gozadores,
Amigos de no vinho ter consolos,
Foram com Satanás fazer colônia,
Antes lá do que no Céu sofrer os tolos!

Ora! e forcem um'alma qual a minha,
Que no altar sacrifica ao Deus-Preguiça,
A cantar ladainha eternamente
E por mil anos ajudar a Missa!"

( ÁLVARES DE AZEVEDO )